Investir na capacidade sistêmica das organizações sociais é caminho para mudanças duradouras

Investir na capacidade sistêmica das organizações sociais

Quem trabalha com impacto social sabe que, embora seja possível atingir excelentes resultados com ações focadas, a grande dificuldade é transformar a soma dessas ações em mudanças sistêmicas. Já pudemos observar que ações de impacto social podem produzir melhorias concretas no nível dos sistemas, mas não mudam esses sistemas a longo prazo. Por exemplo, já se provou que conseguimos reduzir significativamente a mortalidade materna ou infantil. Mas, se houver um contexto de crise, essa redução pode se reverter rapidamente. O segredo é conseguir fazer com que as mudanças se perpetuem, e assim possibilitem novas mudanças, em um nível mais elevado do sistema.

Um artigo de Susan Misra e Marissa Guerrero, duas especialistas em ação social e sociedade civil, publicado na Stanford Social Innovation Review, busca entender qual é esse “ingrediente secreto” para alcançar transformações sistêmicas. Para resumir, a resposta é simples: investir mais na capacidade sistêmica. Mas como esse conceito abstrato de “capacidade sistêmica” se traduz concretamente? Primeiro é preciso entender o que significa esse este termo. Capacidade sistêmica é justamente a capacidade do sistema de se autossustentar e seguir criando impacto positivo ao longo do tempo. Por isso, o investimento nessa capacidade deveria ser um objetivo por si só, pois é ela que garante todos os outros objetivos.

Engajamento e organização comunitária

Um sistema forte é capaz de acelerar os avanços nos momentos oportunos, aprofundar a implementação de seus ganhos e proteger melhor esses ganhos quando eles são ameaçados. As autoras citam um programa do estado da Califórnia, nos EUA, para investimento no sistema de escolas públicas. Eles apoiam iniciativas locais em 14 condados californianos, e a capacidade de implementação de cada um deles varia muito, de acordo com fatores como a capacidade de organização da comunidade para cobrar melhorias em suas escolas. As comunidades melhor organizadas conseguiam mudanças sistêmicas. A formação de redes é citada pelas autoras como outra forma de aumentar a capacidade sistêmica. Ou seja, um dos principais fatores concretos que possibilitam a transformação é investir no engajamento e organização das comunidades.

Responsividade + estratégia

O artigo também afirma que as organizações com boa capacidade sistêmica combinam a responsividade (conseguir atender rapidamente a uma demanda social urgente) com ser estratégico, e não entendem essas duas abordagens como opostas. Para atingir esse equilíbrio, é essencial ouvir as demandas e feedbacks dos apoiados e envolvê-los nos processos de tomada de decisão. O exemplo dado é de um programa de 10 anos com o objetivo de aumentar a capacidade de movimentos sociais que combatem a violência de gênero. Essa ambiciosa meta estratégica foi alcançada ao começar focando em desenvolver as capacidades de indivíduos que poderiam agir como construtores dos movimentos, atacando as causas da violência. Ao ouvir esses ativistas, a fundação que financiava o projeto evoluiu sua estratégia e incorporar movimentos com outros focos, como pessoas transgênero e encarceradas, duas facetas do tema mais amplo da violência de gênero.

Educação + engajamento

Outra forma de investir na capacidade sistêmica de organizações sociais é garantir que todos os stakeholders de uma organização “comprem a ideia” (buy-in), ou seja, estejam na mesma página quanto aos objetivos e como alcançá-los. Isso pode ser obtido, segundo as autoras, por um processo contínuo de liderança e aprendizado. Isso pode ser feito de várias maneiras. O exemplo que elas dão é de um fundo que apoia organizações que atuam com equidade de gênero e justiça reprodutiva, centrado nas necessidades de comunidades diretamente impactadas por esses temas. A decisão do fundo foi investir na infraestrutura desses movimentos nos estados onde historicamente eles eram subfinanciados.

Outro exemplo é do Omidyar Group, uma das principais redes de filantropia do mundo, que tem o princípio de criar impacto em escala por meio de uma abordagem baseada no venture capital. Cada organização apoiada tem liberdade para decidir como vão obter impacto, assim como uma startup financiada por venture capital tem liberdade para decidir onde investir esses recursos. Essa abordagem potencializa o “buy-in” das organizações. O Omidyiar Groups fornece então treinamentos e educação para que as organizações entendam sobre mudança sistêmica e busque aplicar essa lente em suas ações.

Essa abordagem tem tudo a ver com o Venture Philanthropy, conceito que o Instituto Órizon busca disseminar no Brasil, e a forma como nós apoiamos as organizações sociais que atuam com educação. Nosso objetivo é exatamente ajudar essas organizações a aumentarem sua capacidade de obter impacto e mudanças, por meio de recursos financeiros e não financeiros, em especial capacitação e assessoria para que elas melhorem sua gestão, recursos tecnológicos etc. Temos certeza de que esse é o caminho para transformações reais e duradouras!

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